A Deputada Gaga e o Bullying

Sobre um deputada que tem “gaguez”!

Quando algumas pessoas me procuram começam o seu discurso por dizer; SOU gaga, SOU dependente, SOU ansiosa, SOU hiperactivo. Paro sempre o discurso para uma primeira proposta que nos permita avançar na sessão substituindo o SER por o TER.

E assim o discurso passa a ser oseguinte:

-Ola eu sou a Laura e tenho um problema de gaguez que gostaria de resolver. Alterando esta crença o processo inicia-se num caminho de cura.

Ao longo da ultima semana, tenho assistido com alguma tristeza a um processo de “bullying”, quase colectivo. Para informação,o bullying não é apenas agressão física, a agressão verbal e todo o tipo de comportamento que procura inferiorizar outro, através dos seus pontos vulneráveis é considerado bullying.

Num país, onde tantos pais procuram ajuda, devido ao isolamento dos filhos provocado por questões relacionais, não consigo perceber este tipo de comportamento colectivo.

Portugal elegeu o seu governo e com esta eleição surge uma deputada gaga, Joacine Katar Moreira, como cabeça de lista de um partido.

Tenho acompanhado alguns casos de gaguez, de crianças e jovens perfeitamente capazes intelectualmente e que temem pelas suas vidas, pela sua evolução, pela abertura do mundo às possibilidades e à igualdade de oportunidades, devido a uma simples Gaguez.

O que a sociedade está a dizer a estes jovens, com este episódio político, é que eles estão certos, que devem temer e cingir-se à sua insignificância de gagos e que sempre que tentarem saltar as barreiras impostas pela gaguez, tem um batalhão de pessoas a gozar, a humilhar e a relembrar-los, de que não podem. É urgente começar a pensar de forma mais global e responsável, quando tecemos certos comentários nas redes sociais… Não é só para a Joacine que estão a falar!

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Fui casada com um homem deficiente visual (cego). O meu ex marido, é musico de profissão e é um dos homens mais inteligentes que conheci. Esquecia-me que ele não via. Como tinha alguma visibilidade publica, um dia também vivi um episódio deste género. A banda da qual era o vocalista, foi convidada para juri de um concurso rock “Reis da musica” da RTP1. Como vocalista e compositor, foi ele representar a banda e a sua função era a de avaliar o som da banda concorrente. Do juri faziam parte outros elementos, um que avaliava a performance física e postura em palco, e outro a imagem.

Quando o produtor viu o “cego” sentado no Juri principal, veio a correr falar comigo a responsável que os acompanhava e aos gritos dizia:

-Tem de escolher outro elemento da banda, não pode ser ele ! –

– Mas porque motivo não poder ser ele ? – perguntei

-Porque ele não vê os concorrentes !- respondeu

-Mas ele não precisa de ver, ao lado dele estão os juris competentes para avaliar a parte visual , ele só avalia o que ouve e garanto-lhe que tem melhor ouvido que qualquer um de nós, alem de ter um conhecimento musical, dentro dos vários géneros, demasiado alargado.

-Mas não pode ! – insitia

– Explique-me melhor ,não pode porquê? eu não estou a perceber!

-Ele é Cego ,a imagem não é muito boa, os tiques, os óculos escuros !- insistiu

Aquela justificação embateu como um murro no estômago! E da minha zanga, saiu aquele que seria o melhor dos argumentos para que o programa avançasse com ele no Juri:

– Vamos fazer o seguinte Sr produtor- respondi – está a chegar ao estúdio um grande amigo dele, que vem para um encontro mundial de deficientes visuais , se aguardar duas horas terá aqui no juri Stevie Wonder , ou também não lhe serve ?????!!!!

Stevie Wonder já podia…

Esta experiência revelou-me que nem sempre a deficiência ou a diferença é a grande barreira… Mas sim o preconceito que se tem à partida e claro o pequeno poder!

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O preconceito é sistêmico, é usado maliciosamente, muitas vezes de forma inconsciente, contra quem está vulneravel, mas também contra quem não tem nada a apontar.

É muito comum as pessoas chegarem ao pé de mim em sofrimento, porque estão a começar algo de novo e são apontados e desencorajados, por todos os seus familiares e amigos como se fosse algo de errado, piora se tem alguma vulnerabilidade, e Por isso muitas vezes, nem se atrevem a começar!

Esta é uma realidade que devemos começar precisamos re-desenhar, Aprender a olhar para o sucesso dos outros com amor, olhar para as investidas dos outros com vontade que eles consigam. No caso particular desta deputada encontrar soluções para que se expresse ao invés de a mandar calar.

A Joacine ao candidatar-se, é um exemplo para todos os jovens e crianças que tem gaguez ou outra limitação, mostrando-lhes que podem ir em frente. Devem abrir-se ao mundo, podem levantar a voz, podem ser escutados.

A Joacine dentro da grande capacidade que mostra ter, tem apenas que avaliar se a gaguez e o preconceito se está a sobrepor à mensagem que quer passar e talvez encontrar uma forma diferente de comunicar, assumir um porta voz , assumir um discurso mecânico. Tal como fez Stephen Hawking, a partir de uma certa altura não era possível escutar o som da sua voz, mas era fundamental escutar e conhecer a sua visão e conhecimento.

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