Os distúrbios alimentares são mais comuns do que parece. Uns chegam a quadros de agressivos outros mais suaves, mas em todos os casos o sofrimento com o corpo persiste, umas vezes forte, outras mais leve, enquanto não for olhado de frente será sempre um sofrimento e uma inquietação constantes ! E foi devida a esta constante angustia que a Ana me procurou “Já não tenho sintomas de distúrbios há mais de 20 anos, mas sei que persiste em mim uma angustia com o corpo, preciso de me libertar disto, perceber de onde veio, mesmo com o corpo sem alterações e respondendo bem a tudo o que faço, há uma angustia!”
No caso da Ana não existe uma relação metabólica o seu corpo funciona de forma equilibrada, não há disfunção orgânica. Por isso abordamos a anorexia ligada ao campo emocional.
A anorexia é um meio, como qualquer outro, de manifestar e projectar uma Alma em sofrimento ! é a materialização de uma crença negativa relativa a quem somos e que encontra no corpo através da perda de peso e restrição alimentar, a busca de uma solução ou melhoria para o sofrimento. Mas a questão não está no corpo nem no peso!
Qual a visão sistémica da anorexia ?
Sistémicamente cre-se que os filhos na primeira infância, adoptam sofrimentos profundos dos seus sistemas familiares ( Pais e avós), assumem parte do sofrimento que de forma inconsciente e subtil, com o crescimento começa a manifestar-se das mais variadas formas. A anorexia quando crescem, sistemicamente é considerada uma das formas que encontram, para projectar e libertar o sofrimento adquirido, em busca de paz e de amor próprio transferem para o corpo essa responsabilidade. “claro que é do corpo a culpa, por não me sentir bem comigo!” Não encontrando outra justificação usam inconscientemente o corpo, como bode expiatório para um sofrimento maior!
Porque se perde a noção da imagem ?
Como o corpo é um “bode expiatório” e o problema não está no peso nem no corpo, mas na crença que se tem de si mesmo, por muito peso que perca, quer sempre perder mais, “porque continuava gorda, se não gosto de mim é porque ainda estou gorda preciso de perder mais” … a mente recebe esta informação e a percepção muda, os olhos vem sempre uma silhueta muito maior do que a real! Chegam a pesos quase fatais e entretanto, o problema já é orgânico, endorfino, neuroquimico… o corpo começa a agir sozinho em rejeição á comida e a distorcer a realidade. As prioridade orgânicas são alteradas com base na informação constante da necessidade de perder peso para o bem estar e o sistema endorfino encontra prazer nessa perda e pede sempre mais!
É tal e qual uma droga; primeiro há a diversão , o êxtase as emoções ao rubro, que prometem preencher um vazio! Com o passar do tempo
, os valores de diversão baixam , as emoções são sempre as mesmas, mas o corpo já não consegue funcionar sem as drogas, a informação celular , as prioridades e necessidades orgânicas foram alteradas, pelo hábito de receber diariamente uma dose de uma substancia sem a qual o corpo não quer viver!… Os toxicodependentes aprendem a escutar o corpo da pior maneira, as pessoas anorécticas quando chegam a um limite entregam ao corpo o comando da situação, só a perda de peso cria bem estar!
Porque é que é tão difícil sensibilizar uma pessoa sobre os distúrbios alimentares
e chegam a limites fatais ou vivem uma vida inteira em sofrimento?
Quem sofre com distúrbios alimentares, vê a sua Crença validada e confirmada, por toda a exaltação do corpo , nas redes sociais, publicidade
de, Tv , musica, familiares e amigos… A anorexia ganha uma enorme força, “porque percebemos que não somos só nós, ninguém quer ser gordo”… “porque ser gordo é mau e é feio” … assim uma pessoa que está anoréctica fica descansada porque afinal ela está certa, pode continuar a vomitar, a não comer, a exercitar-se de forma exagerada … porque validou a sua crença “primária” com outra exterior a si, encontrando um bode expiatório para justificar todo o seu sofrimento; ” – não não é só porque eu não gosto de mim… é porque a sociedade é assim!”
E assim se confundem as bases de toda esta situação
Esta foi a ordem do sofrimento da Ana:
Criança – Subtil inconsciente cria a crença : Não sou boa suficiente, a minha mãe/pai também não “talvez se eu sofrer um pouco por eles ,eles sofrem um pouco menos” – Não sou boa suficiente , deixo os outros ganhar, nunca reclamo nada para mim… ajudo a minha mãe em casa, gosto de ajudar os outros! A minha mãe diz que eu sou uma menina especial, mas eu não sinto nada disso!
Pré Adolescência – Continuo a não ser boa suficiente, todos dizem que sou especial , mas não consigo ver nada em mim, também dizem que estou gorda, estou a crescer a minhas amigas tem alegria e eu não sinto nada, gostava de me tornar melhor preciso de me sentir melhor, não sei de onde vem este sentimento. Eu sou gorda e isso é mau, vou começar a tratar disso, provavelmente se eu perder peso fico melhor…
Jovem Adolescente -Perdi 18 quilos nos 3 meses de férias, quando cheguei à escola poucos me reconheceram, perguntavam-me se estava doente, eu achava que não! Comia uma maça raineta por dia. Se por acaso caia na tentação de comer mais, vomitava porque se vomitar as calorias não contam! “Estou magra mas não mudou muita coisa… mostrei os meus poemas ao professor e ele recomendou me ler outros para aprender como se faz, não sou mesmo boa, fui a uma entrevista de rádio para tentar entrar para a Radio, o homenzinho quis saltar me para Cima…se fosse boa não era assim… guardei o livro dos poemas e o sonho da rádio na mesma gaveta! -Vou continuar a vomitar sempre que comer demais!
Jovem – Os homens assustam.me ,ter um homem a olhar para mim é constrangedor, sinto-me ridícula e todos os namoricos que tive ,nunca nenhum quis ficar comigo, se calhar é porque não sou boa suficiente, também recusei sempre mais que uns beijos! Não me sinto à vontade com o meu corpo!
Jovem adulta- Apaixonei-me vou me juntar, o meu namorado … amei acima de tudo a essência dele e hoje sei que ele me permitiu amar também a minha essência e alevezar o meu distúrbio alimentar. Ele não dava importância ao fisico e isso foi confortável, sentir-me útil também me fez bem… encontrei na minha utilidade o merecimento para poder estar e ser apreciada …Mais equilibrada voltei a comer sempre preocupada com os excessos de açúcar ,gordura e álcool…Criei uma alimentação maioritariamente vegetariana. Quando comia demais , vomitava!
Adulta- Ser mãe foi a reviravolta, o meu corpo é maravilhoso o meu corpo procria o meu corpo reproduz. Tenho de me alimentar para alimentar o meu bebé. Não posso não lhe dar carne e peixe, isso é só uma opção minha. Nesta fase a alimentação tomou um novo rumo na minha vida… um propósito maior… Os distúrbios alimentares dissiparam-se… Mas e a origem, onde está ? Porque ainda persiste o sentimento e a crença de não ser boa suficiente ?
Os disturbios desapareceram, mas e a crença de não ser boa suficiente ? porque persiste ?
O corpo tomou conta temporariamente do sofrimento, mas quando valores mais altos se levantaram, como a maternidade , os distúrbios deixaram de ser necessários, o corpo era finalmente preciso para algo MAIOR.
No entanto o Crença criada no inconsciente da primeira infância persiste, e foi isso que trouxe a Ana com a pergunta : ” é possível que mesmo não sofrendo de distúrbios alimentares desde meu primeiro filho, que ainda me sinta anoréctica, que não tenha pelo meu corpo especial afeto, que só o respeito porque não o quero gordo e doente ? É possível que o sinta como algo exterior a mim ? Como se estivéssemos numa constante batalha ?
A Tomada de Consciência
“Porque é que eu não consigo aceder ao sofrimento que o meu corpo guardou à sua responsabilidade e me mantém nesta distancia com ele ?
Como fazer para o abraçar e integrar em mim de uma vez por todas ? Como fazer para gostar dele exactamente como é ? “
O seu corpo já lhe mostrou a grande sabedoria que tem … talvez se todos os dias lhe disser isso mesmo:
Eu já sei que o fizes-te por mim…
Eu já sei que assumiste o sofrimento por mim…
Mas neste momento já não é preciso… está tudo bem ! Já está tudo bem… Deixa me tratar disso… porque eu acredito que esse sofrimento nem é nosso!
Ás vezes as nossas crianças e jovens assumem dores que não lhes pertencem ou crenças de situações mal interpretadas…Por solidariedade aos pais, por lealdade… porque temem ser melhores que eles… porque acham ingenuamente que conseguem tratar das dores sozinhos…
Cada coisa no seu lugar! … Precisamos dizer às crianças que existem problemas que eles não podem resolver, não lhes compete… correm o risco de entender tudo ao contrário.. .há que fazer-las falar das emoções, não há mal em ficar triste, magoado, sentido, zangado… é preciso dar voz às Emoções das crianças para que não prossigam dentro dos seus corpos!
Para a Anorexia e para qualquer Distúrbio ou Doença
O nosso corpo é um leal servidor de tudo aquilo que vivenciamos, da nutrição fisica, à mental e espiritual… assume dores, assume tristezas, assume raivas ,assume alegrias… Bendito seja o nosso corpo fisico e todas a formas que usa para nos ajudar a libertar de alguns sofrimentos… Precisamos de aprender a falar com ele e a melhor forma de falar com corpo é primeiro escutar o coração, falar das dores emocionais, escrever, exteriorizar os medos, as raivas para que o corpo não as acolha, pois às vezes esse acolhimento é feito à base de muitas doenças.
A todos os que transferiram para o corpo as suas dores, sejamos gratos e caminhemos de forma consciente para a cura!