“Estou gordo… sinto me mal… “
“A Falta de Cabelo mexe com a minha auto-estima …”
“Sou baixa demais …”
“O meu nariz é disforme…”
“Tenho um peito enorme, sinto que isso influencia os meus relacionamentos! “
“Sou demasiado alto…”
“Estou cheia de rugas, estou velha… não consigo olhar-me ao espelho!”
Existe uma diferença abismal entre gostar de pessoas e gostar de corpos…
Nasci com uma boa colocação de voz e desenvolvi ao longo da minha vida uma boa capacidade de comunicar.
Para pagar a universidade, trabalhei numa agencia de seguros, basicamente atendia telefones. Os clientes, quando se deslocavam à agência, não conseguiam associar a minha voz ao meu corpo. imaginavam-me diferente: mais alta, mais feminina, talvez mais sofisticada, pois esse era o padrão, na época, das pessoas que faziam atendimento ao publico nos bancos e seguradoras.
Aprendi desde cedo a lidar com a visível decepção, entre a imagem que faziam de mim e da figura real de quem lhes aparecia à frente. Para mim sempre esteve tudo de acordo, o problema nunca foi aquilo que eu sou, mas sim o facto de ter uma voz que os transportava para um perfil fisico de uma perfeição e de um estilo que não era o meu.
Recordo-me do meu pai falar de uma locutora de rádio que era dona de “uma voz maravilhosa , mas fisicamente era uma mulher feia!”… O que não era grave pois há trinta anos atrás as vozes da rádio eram por si só suficientes para ser admiradas… Afinal pouco importava o corpo que transportava aquela voz, a rádio desvinculava-se da imagem.
E é sobre o GRANDE vinculo à imagem a base deste texto. Um vinculo cada vez mais estreito …decisivo para a nossa felicidade e até ALEGRIA de viver… Um vinculo que nos faz sentir derrotados ou premiados… Um vinculo que nos faz competir diariamente com o corpo em que nascemos… Um vinculo que nos indica o “merecimento” de AMOR e de laços. Um vinculo que promete alterar os parâmetros e os valores relacionais.
Passo a explicar:
Alguns clientes chegam a mim para trabalhar a sua dependência do aspecto fisico:
A Maria foi casada com a Eliana e descreve-a como uma mulher linda, dona de um corpo estrutural. Iniciou as sessões porque precisava de encontrar uma forma de a retirar dos seus pensamentos, com o tempo percebeu que tem uma enorme dependência do seu aspecto fisico, mesmo reconhecendo os maus tratos de que foi vitima, não aceita ter perdido aquela “estampa” de mulher, encarou desde o inicio aquela conquista como um prémio merecido:
“Se a Ana soubesse o prazer que me dava olhar para ela… é linda e eu nunca pensei conseguir ter uma pessoa assim na minha vida…”
Para chegar a esta fria conclusão foi preciso algum trabalho. O primeiro passo é reconhecer para depois trabalhar a questão.
O Rodrigo, procurou-me por algo semelhante:
“Inscrevi-me numa daquelas plataformas de relacionamentos, comecei a falar com uma mulher super interessante, na foto de perfil tinha uma foto de fundo de mar, na profissão bióloga marinha, passamos da plataforma para o WhatsApp, e há muito tempo que não conversava com ninguém tão interessante, a conversa dela fazia fluir a minha e de-repente eu escrevia coisas com um sentido, que não achava ser capaz… o pior veio a seguir! “
Então ? Era um homem ?
Rodrigo sorriu e continuou:
“Não Ana, quanto a isso tudo certo, era uma mulher! O perfil não tinha nenhuma foto, pensei até que fosse por não querer ser reconhecida na aplicação e pedi que me enviasse uma…”
O Rodrigo fez uma pausa atrapalhado, revelava alguma vergonha do que queria revelar a seguir:
“Quando vi a foto dela, fiquei atordoado e revoltado, mereço melhor ! Eu sou um homem com bom ar, tenho cuidado com o meu corpo e com a minha aparência… está fora de questão ter uma relação com uma mulher assim, super magra, sem peito, um bocado feia!”
Há quanto tempo o AMOR deixou de ser cego ?
O que dita as relações de AMOR nos dias que correm ?
Durante a adolescência era normal idolatrar cantores e actores e os três miúdos/as mais bonitos da escola eram disputados pela escola inteira, mas na fase seguinte tudo era normalizado e o AMOR falava mais alto que a aparência.
Nos tempos que correm as relações AMOROSAS estão cada vez mais, dependentes do ASPECTO fisico. Cada um faz uma triagem minunciosa nos seus processos de relacionamento e o problema não está na triagem, mas sim nos parâmetros que usam para excluir pessoas da sua lista de pretendentes e dos pârametros que se esquecem de observar ….
A Catia partilhava comigo:
“Ele é maravilhoso, damos-nos super bem, é óptimo estar com ele… desde que começamos a conversar tenho vontade de ir trabalhar porque adoro a companhia dele, brincamos muito, ele consegue completar as minhas frases… mas eu não consigo relacionar-me com um homem gordo… é demais para mim… Eu MEREÇO melhor, eu tenho de andar acompanhada com alguém como EU”
O Luis tem 45 anos e procurou no Tinder uma companheira, colocou nos filtros tudo o que pretendia mas foi supreendido:
” A rapariga correspondia a tudo o que eu filtrei… uma conversa maravilhosa, bem resolvida, bom sentido de humor, pratica, nada dramática, tranquila, nada controladora… e logo tinha de ter um síndrome estranho, ainda que leve de envelhecimento precoce… e eu não consigo, mesmo ela sendo mais nova que eu, só de pensar andar com uma mulher envelhecida, causa-me arrepios!”
O foco deste texto não está no julgamento sobre os parâmetros de triagem, que cada um usa para encontrar um par.
Com este texto pretendo lançar a reflexão, sobre os novos parâmetros relacionais que se foram instalando nas ultimas décadas na sociedade.
Talvez o AMOR que não se explica, o respeito, cumplicidade, volte a não ser o mais importante, para manter uma relação…
Talvez regressemos aos tempos antigos das relações combinadas, agora em vez de ser entre familias, a combinação seja entre aspectos físicos…
Não vou fechar este texto, deixo apenas algumas linhas de reflexão… para quem quiser observar-se e observar…
Deixo no ar a pergunta:
Quando falamos de um relacionamento… O Que é MERECER melhor !??
Que humanidade queremos criar ?
Será que, nestes nossos tempos, há mesmo motivo para nos sentirmos infelizes e não merecedores de alguém por causa do nosso aspecto fisico ? Será que há motivos para nos sentirmos merecedores de mais, por não termos aquilo que consideramos defeitos físicos ?
E quando se conseguem superar esses considerados “defeitos” , seja através de dietas, plásticas ou outras, que sentimentos surgem ? Sentem-se mais merecedoras ? E com que nível de SUPERIORIDADE começam a olhar para aqueles que não os merecem ?
E quando vem alguém não merecedor com alguém merecedor ?
As novas realidades de MERECIMENTO entre os pares, precisa se observada…
O AMOR é a mais elevada vibração emocional…
Existe uma diferença abismal entre AMAR pessoas e gostar de corpos…
