Há uns dias e na sequência das produções que tenho feito de norte a sul do país e na minha mania de observar tudo, escrevi este texto:
“Nosso querido mês de Agosto …
Um país que se transforma em festa… numa enorme tasca onde todos vendem o melhor da terra com um orgulho, que já não parece deste tempo …
Um pais que se transforma num imenso colo para todos os que regressam de férias e trazem nos olhos o brilho, que revela o conforto de chegar a casa … um país que se deixa levar pelos bailes onde algumas mulheres ainda dançam juntas à mistura com novos casais homossexuais … um país onde após uma pandemia procura os limites individuais e colectivos …
Que grande dádiva trabalhar de norte a sul e poder observar estas dinâmicas e perceber o quanto somos iguais e o quanto AMOR podemos dar uns aos outros… Respeitando que cada um está onde tem de estar no seu tempo e ritmo evolutivo , mas através da festa nos reunimos e co habitamos no mesmo TERREIRO e cantamos a uma SÓ VOZ… Bendita Cultura … benditas pessoas…
De norte a Sul do país , boa viagem para todos …NÓS 🙏🙏🙏”
Recebi um comentário de um colega de trabalho:
“Td é facetado, td é passível de mts abordagens, mas é bom ler alguém q se concentra nos ângulos iluminados. Não q os escuros e deprimentes desapareçam mas… julgando o bom, deprimimos menos com o mau, e menos deprimidos teremos sempre melhores soluções. Parabéns pelas palavra” in Rui Braga
Para conseguir olhar para esse tal Angulo iluminado, foi preciso sentir o óbvio na minha condição de gestora cultural e pessoa e até sentir a depressão de que o Rui fala.
E o que é sentir o óbvio ?
O óbvio é perceber o quanto o nosso país está escasso em qualidade cultural, o quanto as festas e arraiais ecoam musica e composições de má qualidade. O quanto nas letras da chamada musica “pimba” que tocam incessantes nos holofotes dos recinto, se promove o machismo, a vulgaridade, a ordinarice a piada fácil . O quanto ficam esquecidas as raizes, porque não há quem as conte ou cante, nem tão pouco quem esteja disponível para as escutar e amplificar.
Sentir o óbvio é perceber que após uma pandemia existem dinâmicas sociais que estão desajustadas e parece que todos perdemos um pouco a noção de limites e do espaço do outro..
Sentir o óbvio é também observar que mesmo num país onde centenas de homens lutam contra fogos, ainda existem localidades que não pensam cessar o fogo de artificio, em prol da tradição.
Sentir o óbvio é perceber o quanto o açucar e o álcool são combustível destas feiras, como se sem eles a festa não existisse. A embriaguez de novos e velhos turva-lhes as vistas e a mente para tudo o que se possa ali passar , e os excessos são cometidos em rotina dia após dia de norte a sul do país.
Sentir o óbvio é perceber que mesmo perante uma ameaça ao equilibrio do planeta, a carne é o prato do dia, devorada em todas as tascas como se não houvesse amanhã… e que não existe vontade alguma em alterar a ementa, nem que seja para dar resposta aos que já optaram por outros estilos de vida…
O óbvio é perceber que todas as crianças que assistem a este cenário estão a receber informação educativa baseada no exemplo, afinal a forma mais eficaz de aprender!
Quando conseguimos olhar para todas estas questões sem raiva ou qualquer sentimento de superioridade, conseguimos ver um pouco além desse óbvio e reconhecer até perceber a alegria, que leva à euforia, a felicidade básica do regresso a casa ou à terra, o brilho nos olhos provocado pela libertação de um ano de trabalho e acima de tudo, saber de forma muito LUCIDA e CONSCIENTE que se assim o fazem é por não saber fazer de outra maneira.
Ainda que desejasse que tudo fosse diferente e acredito que é urgente uma nova educação social e cultural, isso não passa do meu modelo de consciência, ou dos meus interesses. Por isso sei que não sou ninguém para julgar, criticar ou jorrar raiva para cima de pessoas que afinal, estão a viver a sua vida na sua melhor versão e para elas está tudo bem.
Fazemos cada um o melhor que sabemos , fazemos cada um aquilo que viemos cá fazer e…o AMOR que podemos sentir uns pelos outros é a única coisa que vale a pena…
Após uma longa viagem ao que me poderia deprimir e em respeito às escolhas de cada um, dentro de um todo do qual faço parte, ilumino o mês de Agosto e viajo em Paz , levando humildemente a cada festa o melhor de mim… Em AMOR … Sempre em AMOR …
E circulo pelas estradas do nosso país, desejando a cada um que passa por mim, uma BOA VIAGEM!…
